A sociedade brasileira tem uma capacidade imensa para o ódio. É o que afirma o historiador Leandro Karnal
" São os ódios pequeno-burgueses, que independem da renda das pessoas.
A pequena burguesa é um estado de espírito. "
No mundo contemporâneo, nos referimos a nós mesmos como seres pacíficos, e manifestamos um pretenso horror ao ódio externo. Mas temos dificuldade para admitir nossa natureza contraditória e violenta, sem nos dar conta de que cometemos o que o historiador classifica como “pequenos ódios cotidianos”, manifestadas também no centro dos embates políticos.
“A esquerda idealiza o futuro possível e a direita, um passado improvável. Uma diz que tudo pode ser perfeito na revolução, e outra, que no passado tudo era melhor. Tanto a esquerda como a direita nos prometem, em meio a profundos gestos de ódio e a revolução, que, se nos voltarmos a eles, haverá momentos perfeitos”, diz. “Só que nas sociedades perfeitas, o ódio continua existindo”, completa Karnal, lembrando os índices de suicídios entre jovens no Japão e os atentados cometidos por um extremista de direita na Noruega contra estudantes.
“À medida que as utopias diminuíram, os pequenos ódios cotidianos afloraram com força inédita. São os ódios pequeno-burgueses, que independem da renda das pessoas. A pequena burguesa é um estado de espírito. É aquele que comete o pecado essencial do pequeno ódio definido pela cultura cristã como a inveja. A tristeza pela felicidade alheia, como definido por São Tomás de Aquino. Ou, como Nelson Rodrigues esclareceu: ‘no Brasil o êxito pessoal é um insulto, e um insulto à minha pessoa’. Toleramos a dor alheia, mas não me venha contar os seus sucessos.”
Essas pequenos ódios cotidianos é o que leva, por exemplo, cidadãos pacatos do interior dos EUA a lutarem no Iraque e se transformarem em carcereiros tão cruéis quanto qualquer guarda de Auschwitz. “O ódio, como perceberam os nazistas, era o elemento mais fácil para se unir um grupo”, diz o professor. Como caso corriqueiro, ele cita o exemplo de grupos heterogêneos dentro da sala de aula, que alimentam rivalidades e desprezos uns pelos outros até o momento em que o professor decide dar nota baixa a todas. Naquele momento, o professor passa a ser um elemento de ódio em comum – e os estudantes, unidos, se unem como irmãos. “É difícil amar em comum. Mas odiar é uma delícia.”
Essa delícia, mostra o palestrante, tem a ver com os valores de uma sociedade fundada na violência. Nessa violência, a gratidão é um peso. “O bem nos humilha. É feio chorar ou emprestar dinheiro.” Em compensação, o ódio é sinal de força: engolir uma ofensa calado é sinal de fraqueza. Numa cultura falocêntrica, em que o masculino é considerado superior ao feminismo, o perdão e a conciliação são considerados características femininas. “O ódio, além de conferir unidade, confere força e dinamismo. É como o homem capaz de tomar uma atitude quando o serviço é malfeito. Temos um deleite pela força e pela violência.”
Fonte
https://www.facebook.com/cpfl.cultura/photos/a.177976805617907.44777.162849010464020/797097857039129/?type=1&theater
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